Políticas Culturais e Blumenau[1].
Márcio José Cubiak[2]
Esta é uma contribuição ao debate sobre políticas culturais em Blumenau querechaça o conceito de arte e cultura dominante em nossa cidade. Quero focar nos desafios e nas oportunidades que Arte e Cultura podem gerar, simbólica e economicamente, quando trabalhadas de forma sistêmica, como política de estado, partindo da diversidade.
Estamos participando de um momento em que os segmentos culturais exigem a garantia da cultura como direito fundamental a ser gozado. Todos os dias, global e localmente, novas identidades surgem e demandam legitimidade. E como os Direitos são construções históricas, resultado das relações de poder e da luta de classes em cada época, é necessário entender que não há imutabilidade: todas as culturas e todas as identidades sofrem impactos cotidianos e, ao mesmo tempo, geram outros.
Por exemplo, o impacto e as possibilidades nascidas a partir dos novos meios de comunicação e a troca de informações e conteúdos a partir da Internet. Blogues, redes sociais, portais de notícia e projetos colaborativos são exemplos. Uma idéia circula e acaba plantada em outro tipo de solo, germinando. Além disso, cito como exemplo, a informação trazida pelo IBGE (2008) que mais de 40% dos habitantes desta cidade são migrantes que vindos de outras partes e muitas vezes engrossam as periferias e bairros mais distantes, trazendo outros personagens, novas demandas.
Incluo, ainda, a necessidade de se repensar o conceito de crescimento econômico e de desenvolvimento regional, a partir da falência do modelo catarinense, agregando preocupações sociais e ambientais, que são temas e reflexões de pesquisadores em busca de alternativas justas e equilibradas, em oposição a obsessão burguesa pelo crescimento e lucro a qualquer custo, desconsiderando os impactos gerados.
O que esses impactos trazem de novo, para a cidade? Como os artistas, produtores, comunidade e poder público encaram essas transformações, como oportunidade ou perigo?
Nesta reflexão procuro enfatizar que um discurso pseudo-antropológico sobre a cultura local é privilegiado. O privilégio pressupõe que, numa outra ponta, alguém esteja em desvantagem. Nesta disputa (sim, por que há forças distintas e conflitos), o teuto-brasileiro tem força e dinheiro a sua disposição. É preciso vender a saga dos imigrantes como pacote turístico. As forças industriais e comerciais da cidade aliciam a classe política, que acata com carinho, as solicitações para que hotéis estejam lotados, ou que as toalhas blumenauenses possam ser vendidas aos milhares por que são feitas na Europa brasileira.
Vender a cidade alemã, que acaba sendo cenográfica e irreal, gera lucros aos cofres municipais, é excelente negócio e poderoso diferencial entre a luta das marcas e empresas. A contrapartida é paga pelos sujeitos e coletivos, cujas reivindicações são secundárias e invisíveis. Os nordestinos, os paranaenses, gaúchos, os negros, as mulheres, as mil facetas da juventude, os gays, essa ampla maioria da população, é silenciada restando a opção do entretenimento no Shopping Center ou das ações do seu respectivo gueto.
As administrações municipais vêm dificultando a vida dos artistas. Nos últimos 14 anos, muitas semelhanças e diferenças. Porém, é fato: faz muito tempo que Blumenau não tem um governo que leve a sério o desenvolvimento cultural a partir da diversidade, utilizando-se de políticas públicas. Cada governo esforça-se em deixar uma marca, simplificando tudo num plano de governo. O prefeito Kleinubing prefere ter sua gestão marcada pelo funcionamento do Fundo Municipal de Apoio a Cultura, por exemplo, mesmo que tais recursos sejam insuficientes para a demanda local.
O fato novo, para artistas e produtores, esta na urgência em romper com uma dependência simbólica em torno da FCBlu. Como? Criando e fazendo circular. A obra do artista precisa ser exposta a outros olhares, expondo-se ao controverso. O artista precisa refletir sobre o sentido de sua criação. Ele deve se associar seja com outros artistas, produtores ou a comunidade. Aliás, o apoio da comunidade é fundamental. Enquanto os Pontos de Cultura trabalham a diversidade a partir da iniciativa de artistas ao redor do Brasil, Blumenau ainda não tem nenhum implantado. Somente agora, duas iniciativas foram aprovadas, representando mais de R$ 350 mil reais em investimentos culturais na cidade nos próximos dois anos.
Investir energias na organização e abertura de espaços culturais alternativos, ligados a uma comunidade; as inúmeras oportunidades dos recursos audiovisuais (cinema, imagem e vídeo); as ações do Ministério da Cultura nos municípios, como o programa “Mais Cultura” e os Pontos de Cultura ou a criação de cooperativas culturais são exemplos de fronts culturais para Blumenau. Os produtores culturais, meu caso, devem caminhar na direção de projetos culturais que possam ter seqüência e desdobramentos.
Quanto ao poder público, este precisa abandonar o desinteresse pela área, enxergar as oportunidades de desenvolvimento que a cultura pode gerar. Não é só um caso de recursos financeiros: é importante ter capital social para coordenar essas ações. Falta investir em capacitação para os profissionais, públicos ou privados, que trabalham com a gestão e produção cultural. E os dirigentes dos órgãos de cultura devem ter capacidade técnica e sensibilidade e não meros candidatos derrotados acomodados em um cargo, como é nosso caso atualmente. Precisa, acima de tudo, se espelhar nas ações do conselho de cultura (que tem seus problemas e qualidades). São as ações do Conselho Municipal de Cultura na defesa do Fundo Municipal de Apoio a Cultura que asseguram a visibilidade dos novos personagens da cidade e da diversidade cultural, fruto das convergências trazidas pela contemporaneidade até este Vale Europeu.
Outro ator importante nesse processo é a Universidade. A Instituição deve contribuir na elaboração de pesquisas e mapeamentos sobre o tamanho e os números da cultura aqui em Blumenau (poderão ser subsídios importantes na hora de planejar, essa ferramenta não utilizada pelo poder público). A Universidade tem a obrigação de fomentar a diversidade, pois é o espaço público de excelência. É espaço de construção de conhecimento.
Por fim, o poder público tem o desafio de aceitar a diversidade e ir além: incentivá-la. Apostar na democracia cultural ao invés de privilegiar um lado da história. Tem que pensar a cultura como estratégia de qualificação social para o futuro
[1] Artigo publicado no Jornal Expressão Universitária Número 05, página 08, de outubro de 2009, sob o título “Diversidade na Europa brasileira”.
[2] O autor é Cientista Social e produtor cultural.
2 comentários:
Ótima reflexão Márcio.Parabéns!
Márcio, já conhecia o texto do Expressão Universitária. De fato, capitalizar a cultura a partir do reconhecimento da diversidade significa promover o desenvolvimento sustentável da região. Não se trata de negar o germanismo, mas de reconhecer sua coexistência.
Abraço fraterno,
Viegas
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