domingo, 12 de julho de 2009

Sobre o Nosso Inverno

(Escrito a partir das mensagens eletrônicas que recebi a respeito da organização do Nosso Inverno)

Olá pessoas, boa noite!

Não participei das discussões do Nosso Inverno, não faço parte da Comissão organizadora e também não sou proponente de nenhuma atividade artística no evento (mas estarei no Carlos Gomes como público e, parece-me, participando de uma mesa redonda). De antemão digo isto para aqueles que creem que sou um "alienado" ao evento e que por isso não tenho o direito de me manifestar. A estes sugiro que apaguem esta mensagem neste momento já que não devo falar nada mesmo. Afinal, este NOSSO inverno não me pertence. Entretanto, considerando que minha caixa postal vem sendo diuturnamente bombardeada por mensagens do Nosso Inverno, considero-me no direito de me manifestar a respeito. Manifesto-me não na condição de escritor ou de qualquer outra coisa que o valha, mas de cidadão e de alguém que nestes 32 anos de vida aprendeu a prestigiar a arte, consumi-la (sim, por que não?) e, principalmente, debatê-la.
Este tempo todo fiquei quieto no meu canto. Não quis me meter, afinal, quando houve aquela palhaçada com a Marlene, o pessoal indo até a Fundação como "Cândidos" voltaireanos, legitimando a mulher no cargo, debatendo com quem estava lá apenas recebendo as benesses dos apoios partidários de antanho, troquei algumas palavras a respeito no Escambau e disse o que pensava, disse como cidadão e não como "artivista" e conquistei algumas inimizades. Arfff... Lembro-me d´"O velho e do Mar", aquela luta insana contra o peixe e a chegada à praia com a carcaça do animal às costas - a carne ficara com os tubarões, enfim!
Mas vamos à questão.
Sempre fui, e continuarei sendo, favorável à organização dos artistas. Sempre defendi o diálogo, a troca de ideias, de experiências e, principalmente, o espírito colaborativo. Entretanto, sempre critiquei o onanismo coletivo, o oba-oba, o exibicionismo puro e simples maquilado de manifestação artística, o bairrismo chauvinista e mesquinho.
Acredito que o Nosso Inverno tem que acontecer, claro que sim, mas não podemos deixar de olhar para este movimento sem tentar compreendê-lo, sem tentar questioná-lo, sem desconstrui-lo.
Lembro-me quando o Márcio lançou a ideia lá no Escambau. Achei porrada, e fiquei até entusiasmado - confesso. A ideia era dizer o quanto faria falta o FITUB e o quão relegada à própria sorte estão as manifestações artísticas na cidade. "O negócio vai pras ruas", pensei. "O pessoal vai fazer movimento, fechar a XV, pensar o novo, dar seu grito", sonhei. Mas aí repete-se o mesmo erro, aquele que fizeram com a Marlene, conversar com o Teatro. Porra gente, por que será que o TCG resolveu ser tão bondoso agora? Tudo gratuíto, tudo certinho, a arte nos conformes, disciplinada. Coisa do tipo: "pois é, chama as crianças, a gente dá os pirulitos e fica tudo certo, a gente limpa a nossa cara, não vão mais poder dizer que não abrimos espaços, fazemos uma moral junto da rapaziada, todo mundo limpinho, o ranho do nariz lavado e depois colocamos todos para dormir." Por que esta mesma direção do TCG não chamou a organização do FITUB e disse: ó rapaziada do teatro, se o problema é grana para fazer o festival a gente abre as portas do TCG, sem custo, dá equipe e tudo mais. O SESC podia entrar com iluminação e sonorização. A prefeitura dando mais uma forcinha, os empresários outra, afinal, SÃO MAIS DE 20 ANOS, e depois, o FITUB não é só teatro, é debate, é diálogo do povo daqui com o povo de lá, das outras bandas, tem até artista de fora, da Argentina, Uruguai, Colômbia, Portugal etc. Um negócio cosmopolita que estava dando certo. Pois é, mas pro FESTIVAL ninguém se mexeu. Ninguém mesmo! Foda-se, a gente faz o nosso inverno, todo mundo aparece, até mesmo quem nunca produziu arte nenhuma, a gente bebe, fuma, escuta música, vê peça, quadro, uns poemas - quem sabe - e depois sai feliz, com a certeza que fez história, que nunca Blumenau viu nada parecido. Arfff de novo!!!!
Seria bom, seria ÓTIMO, seria MARAVILHOSO que todos sentíssemos o enorme buraco deixado pela ausência do FITUB este ano. Seria ótimo que o TCG viesse a público reconhecer que nada fez para manter a periodicidade do festival. Não quero ser como aqueles maridos frustrados que afogam suas mágoas na cachaça do botequim. Estarei no Nosso Inverno, mas não beberei dessa cachaça, porque meu luto é pesado, porque há um buraco que é enorme, porque este narcisismo medíocre mata as possibilidades de se construir coisas realmente novas. Pessoal, Blumenau vive dessas overdoses, e o Nosso Inverno é mais uma delas. O pessoal das antigas deve lembrar do movimento Blumenália Poética. Eu me lembro, por exemplo, das Tardes Bêbadas e, ao conversar com diversos artistas mais experientes , e pessoas que já viveram muitos momentos da história cultural dessa cidade, descubro que não há nada de novo debaixo do sol. O Festival movimentava grupos do país inteiro e do exterior, o nosso inverno movimenta quem?
Certamente o evento será um sucesso. Terá público, claro que sim! Afinal, são mais de 200 artistas. Se cada um trouxer pai e mãe já serão 600 pessoas. E tem os irmãos, filhos, cônjuges, avós, tios etc... Deve dar uns 2000, por baixo. Vai ser legal, o Santa vai cobrir o evento, o Gustavo Siqueira talvez esteja lá com o microfone da Galega entrevistando os mais descolados e, claro, vai estar cheio de blogueiro e twitteiro. Será a glória em bytes, pixels e tinta. Depois... Bem, depois veremos se teremos Festival em 2010. Talvez o TCG, a FURB e a FCBLU considerem o evento desnecessário já que NOSSA colônia, sempre tão ordeira, com artistas tão exemplares e disciplinados que organizam eventos tão bonitos e são recebidos pelo presidente do TCG (glória das glórias!) consegue por si só organizar o Nosso Inverno!
Desculpem o desabafo, mas não consegui mais ficar quieto. Como disse, acho importante que os artistas dialoguem e se organizem, que lutem por sua arte e por espaços, que consigam viver dela, mas não consigo fechar os olhos para o que está acontecendo.
Márcio, tens razão quando te indignas com o horário da peça manifesto, mas creio que esta peça não precisa e não deve estar DENTRO do Teatro, não agora, não neste momento. No exato momento da abertura do Nosso Inverno, quando estiverem sentados nas poltronas nossos administradores da cultura, esteja a peça manifesto na praça ou na rua. Que se faça um verdadeiro manifesto. Que se enfie o dedo na ferida e se lacere as úlceras. A cidade precisa purgar seu descaso! Eu estarei lá, na praça, na rua, para aplaudir e me envergonhar também, afinal, como cidadão, sou responsável pela realidade que compartilho.
Abraço a todos,
Viegas

7 comentários:

Costa disse...

Olá, Viegas. Obrigado por suscitar o debate público. Minha resposta está aqui:

www.blog.costadessouza.com

abraço!

costadessouza disse...

http://www.costadessouza.wordpress.com

mando assim pra ver se entra o link.

ou clique no meu nome.

abraço

viegas disse...

Pois é, Costa, o que eu tinha para dizer já o disse e já conversamos pessoalmente a respeito. O texto está aí, os argumentos também. Cada qual fará a leitura que quiser e puder. Desejo-te sorte neste inverno. Eu, da minha parte, sinto cada vez mais frio. Nunca houve inverno tão frio em Blumenau!Mas lembre-se, talvez o que defendes agora, em teu blog, nesta tua postagem, seja exatamente o mesmo que fazias na porta da igreja aos 19 anos, a diferença é que antes pensavas no "Diarinho", como tu mesmo dizes. E agora? Mas importante tua manifestação, gostaria agora de ver a indignação.
Abraço fraterno,
Viegas

costadessouza disse...

Olá, Viegas!

A defesa na porta da Igreja não era pensando no Diarinho. Pensei no Diarinho quando estive perto de ser agredido.

o que penso agora está lá.

abraço

Fábio Ricardo disse...

Desculpem-me os membros do grupo de teatro, mas acredito que o Nosso Inverno seja MUITO MAIS do que uma reclamação ao poder público pelo fato deles terem terminado com o Fitub.

Se querem que seja assim, que façam uma real reclamação. Apenas para teatreiros e apoiadores.

Mas o Nosso Inverno é muito mais do que isso.
É muito fácil xingar o TCG dizendo que ele não apóia, depois que já se está lá dentro, o que prova que de certa forma ele está sim, apoiando.

O Nosso Inverno nào é apenas um manifesto.

Manifesto se faz na rua, aos gritos ou às flores.

Um manifesto pode até fazer parte do Nosso Inverno, mas ele não se resume a isso.

Ele é um evento multicultural.
Uma prova de que existe cultura nessa cidade, e de que nós ficaremos (por nós digo a comunidade blumenauense na qual me incluo, se é que posso generalizar) muito felizes se o poder publico perceber isso e nos ajudar a fazer a cultura dar certo.

E nada melhor do que dizer isso para eles, do que provarmos que somos capazes.

Marcelo Labes disse...

Acho a discussão válida. Muito válida mesmo. No entanto, não acho o momento oportuno. Está aí o Nosso Inverno e estão aí as nossas angústias. Mesmo assim, não creio que seja válido misturar as coisas. A discussão que Viegas propõe vem de muito tempo e ultrapassa o acontecimento do festival. Insisto que devamos discutir isso depois ou "para depois"... Invalidar a proposta é foda, ainda que se tenha poréns. Eu também os tenho, mas mesmo assim apóio (com minhas idéias, lógico, eu que me mantive distante da coisa toda)pelo que se fez. Talvez depois que o festival acontecer a gente, organização e público, possamos sentar e discutir a fundo. Será muito mais proveitoso do que iniciar a discussão nesse momento, em cima da hora de acontecer.

Mas vamos lá. Se adianta de alguma coisa - e se o espetáculo-protesto acabou ficando para a 1h (quando certamente não o assistirão nossas prezadas autoridades etc e tal), que seja encenado na mesma hora da abertura. Mesmo que não estejam lá, saberão muito bem o que aconteceu - porque se fará questão de falar a respeito.

Tomara que os colegas organizadores do Nosso Inverno não tomem isso como uma simples fissura. Mas em se tratando de engajamento, não vejo nada mais satisfatório do que subverter a subversão, se é que me entender.

Vamos discutindo, vamos adiante.

Abraço.

Anônimo disse...

Por Maicon Tenfen.

Atragédia se anunciou com o cancelamento do Festival Universitário de Teatro de 2009, uma tradição de 22 anos que se quebrava por falta de verbas. Bem, pelo menos era isso que se dizia enquanto lideranças e instituições da cidade resignavam-se a lamentar o fato. Quase ao mesmo tempo, a Sra. Marlene Schlindwein, então empossada presidente da Fundação Cultural de Blumenau, admitia publicamente que a sua nomeação era fruto de negociações partidárias e, nas páginas do Santa, anunciava o seu curioso “modelo Titanic”. Algo assim: o navio está indo para as cucuias enquanto tocamos violino para consolar os passageiros!Pensei que a chamada classe artística blumenauense reagiria à tamanha arbitrariedade. Que nada! Com uma subserviência quase canina, responderam aos paliativos do poder público e acabaram legitimando a política cultural proposta pela atual gestão. Mas devo dizer em defesa dessa mesma classe artística que, tempos depois, conseguiu se organizar em torno de uma proposta promissora para preencher a lacuna deixada pela ausência do Festival de Teatro: um evento chamado Nosso Inverno, que ocorrerá no princípio de agosto e contará com a presença de quase todas as modalidades artísticas locais.Iniciativa louvável, especialmente porque a proposta inicial do Nosso Inverno contém um caráter de PROTESTO contra o descaso com que os bens culturais são tratados em Blumenau. Porém – ai, ai, ai – sempre precisa haver um porém! Considerando que instituições que se calaram diante do naufrágio (olha o modelo Titanic aí!) do Festival de Teatro agora estão arregaçando as mangas para o Nosso Inverno, e também considerando o servilismo com que certos agrupamentos de artistas costumam agir, pergunto se um evento que a princípio seria protesto não corre o risco de se tornar o oba-oba autocongratulatório de sempre.Pessoas que participam da organização do Nosso Inverno garantem que o caráter de protesto permanece, independentemente do apoio oficial. Isso me tranquilizou. Mesmo assim, gostaria de deixar algumas perguntas: 1) o atual evento não servirá de álibi para a extinção definitiva do Festival de Teatro?; 2) por que instituições como a Fundação Cultural, o Sesc, o Teatro Carlos Gomes (e a Furb, que perdeu o fôlego) não foram tão generosas quando se anunciou o cancelamento do festival?; 3) o Nosso Inverno será um evento sério, com crítica e debate, ou uma festinha de compadres que gostam de bajulação?; 4) estamos tocando violino para consolar os passageiros?

Fonte: JSC, 23/07/2009