segunda-feira, 13 de outubro de 2008

CURTAS
Viegas Fernandes da Costa

QUINTANA

“Quem não compreende um olhar tampouco compreenderá uma longa explicação”, ensinou Quintana. E hoje fez um céu de milagre. Todos os céus são de milagre. Quem sabe o eclipse... E há este sorriso franco neste rosto triste. Como consegue este rosto triste sorrir tão francamente?

SOLIDÃO

Como uma frase de Flaubert em “Madame Bovary”, como aquela aranha que tecia a sua teia em algum coração.

PERGUNTA

Uma vela, uma praça, uma noite. Por quem queima a vela? Por quem vela a noite? Ah, e a praça onde dorme nossa cegueira! Quem está lá?

NO CAMINHO DAS GUARICANAS

No caminho das Guaricanas, onde a estrada margeia o rio e o carro sacoleja na cadência dos buracos, as uvas embalam o olfato.

SARTRE

A qualidade literária d’A Náusea está no fato de nos deixar nauseados.

LEMBRANÇA DE FERNANDA

Onde encontrar este verso, esta palavra que procuro, senão nestes olhos de parda beleza trágica? Durmo no interior da intimidade do seu desejo, descoberta ainda há pouco. Tão pequeno este seu corpo, que o tomo entre as mãos, na calma de uma posse que se sabe efêmera...
... sobre estes lençóis, nesta noite que dorme eterna.

AFRODITE

“Da espuma das ondas do mar, nasce Afrodite”, contou-me aquele garoto de onze anos.

SILÊNCIO

... este silêncio próprio do universo, este sacro silêncio que nos aproxima do divino... como os olhos que se encontram e entendem tudo.

UM PÁSSARO

Um pássaro sem asas corta o ar e busca o chão negro de asfalto. Pássaro sem, penas, curioso, que corta o ar e busca na pedra o seu repouso. E como sangra o pássaro que é homem! Arrebol na sarjeta!


* Viegas Fernandes da Costa é historiador e escritor, autor de Sob a Luz do Farol (2005) e De Espantalhos e Pedras Também se Faz Um Poema (2008). Escreve no blog http://viegasdacosta.blogspot.com . Permitida a reprodução desde que citado o autor e o texto mantido na íntegra.

Um comentário:

Ali Assumpção disse...

eita, que surgiu uma lágrima no canto interno do meu olho direito.

gosto tanto da simplicidade...das palavras breves...
gracias , viegas!