terça-feira, 22 de julho de 2008

A vida é filme



Querido Lê,

Hoje nos vimos e descobrimos juntos que a vida é um filme. Um longo longa-metragem, constantemente desfocado pelas lentes da memória.

Percebemos as cenas que relegamos ao marasmo, os pensamentos sem corte dos filmes iranianos e os minutos eternos entre o desejo e a satisfação.

Sacamos nossas hipérboles fellinianas e gesticulamos muito ao falar. Foi uma dança de sombrancelhas e sílabas abertas, no falar cuspido e passional.

Compartilhamos constipações com o Bergman e sofremos em segredo nossos cortes com navalha, úlceras de benzina, nosso odor esverdeado. Somos mulherzinhas histéricas e autodestrutivas, chorando em frente ao espelho e rindo da própria cara, escarnecendo de nossas lepras e assim somos mulheres de Bergman.

Mas jamais perdemos o olhar agridoce do Chaplin, nossa inocência calculada, nossa patetice encantadora. Por isso caímos de escadas, esbarramos em mesas e nos apegamos aos cachorros. Pois somos patetas e nossa tristeza é engraçada.

Estamos no palco, as luzes estão sobre nós e devemos entreter a platéia. Mas nossa mala de truques e traquinagens está vazia e assim estão nossos corações e, talvez, se simplesmente sentássemos por horas, olhando nossas sombras, nossa performance seria vanguarda.

"Respeitável público: queremos ser dignos de vossa gargalhada!".
"Ha, ha, ha", riem eles, lacônicos.

Hoje nos vimos e juntos descobrimos que a vida é um filme. Devemos criar pequenas tensões e conflitos, mas nada que assuste demais nossos espectadores. Podemos encenar mutilações e estupros, mas falar de beijos na esquina e de milagres não premeditados pode ser arriscado.

Devemos rechear esse roteiro de pequenas transgressões - as suportáveis, e depois encenaremos remorso, com a mão na cabeça e olhar distante, e depois suspiraremos.

Sonhamos à noite com amores platônicos mas acordamos sedentos por cheiros familiares. Estamos fadados às poluções noturnas e inconscientes nesse eterno momento pausado?

Hoje nos vimos e estamos acordados. Quando estamos acordados, esse figurino pesa uma tonelada, nossas espadas são de isopor e degladiamos robôs revestidos de pele pulsante.

Mas, apesar de acordados, não estamos presentes. Estamos sonhando outra história, onde mesmo pobres e tímidos, ainda assim somos muito interessantes.

7 comentários:

Ali Assumpção disse...

baaahh!

Anônimo disse...

Cerro
boca
fronte
verdade.

Anônimo disse...

Clara, gostei muito deste teu texto. Muito inspirado, muito bom. Diria mesmo, ótimo.
Parabéns!
Taninha Rodrigues

Ali Assumpção disse...

oi taninha!
q bom tua visita por aqui!
amei suas "espontânias" no teu blog
(só naium deixei coment pq não tenho login no uol..)
to te enviando um convite p vc poder postar tuas artes aqui tbem!
beijos...

Anônimo disse...

Oi, Ali, é que ainda estou com problemas para acessar o Orkut. Descobri um meio de ao menos ler os recados, mas não dá pra interagir. Sim, quando puder e com o PC em casa, vou estar aqui participando com essa galera bacana e muito inteligente. Valeu?
meu email pessoal pode ser o gmail - tania7rodrigues@gmail.com - ou hotmail - tania7rodrigues@hotmail.com. OK? Grande abraço e beijo no coração.

Clara Mendes disse...

oi tânia.
não te vi na festa do escambau, mas é bom te ver por aqui.
qual o endereço do teu blog?

Anônimo disse...

Oi, Clara é http://tania-rodrigues.zip.net, ok?
Grande abraço!